Uma cobrança que perdeu o sentido
A contribuição previdenciária dos aposentados e pensionistas do serviço público é uma das maiores injustiças ainda presentes no sistema previdenciário brasileiro. Criada em 2003, pela Emenda Constitucional nº 41, foi apresentada como uma medida emergencial para ajudar a cobrir o déficit dos regimes próprios de previdência social (RPPS).
O problema é que o caráter temporário se perdeu. O que deveria ser uma contribuição excepcional tornou-se permanente, penalizando justamente quem já cumpriu, com décadas de trabalho e contribuição, o seu dever para com o Estado.
Um novo cenário previdenciário
Desde 2013, o Brasil vive uma nova realidade previdenciária. Com a criação do Regime de Previdência Complementar (RPC), os servidores que ingressaram no serviço público passaram a contribuir apenas até o teto do INSS, podendo complementar sua aposentadoria em planos de previdência privada.
Com isso, o governo redesenhou o sistema, criando uma transição natural. Os antigos servidores, vinculados ao RPPS, estão sendo gradualmente substituídos por novos servidores vinculados ao RPC. O resultado é que o déficit que justificava a cobrança dos aposentados vem diminuindo naturalmente, e a contribuição sobre seus proventos perdeu completamente a razão de existir.
Uma desigualdade entre gerações
Hoje, há uma clara injustiça entre gerações de servidores. Os novos servidores, vinculados ao RPC, não pagarão nada após se aposentarem. Já os antigos, que contribuíram durante toda a vida ativa com o total de suas remunerações, sem respeitar o teto do INSS, continuam obrigados a destinar parte de seus proventos — muitas vezes 11% ou 14% — para o RPPS, mesmo sem qualquer contrapartida.
Trata-se de uma distorção que fere o princípio da isonomia, criando cidadãos de primeira e segunda classe dentro do mesmo serviço público.
Tributação sem retorno
A contribuição dos aposentados e pensionistas não gera nenhum direito adicional. Não há aumento de benefício, nem expectativa de nova prestação. É, portanto, uma cobrança sem causa previdenciária, que se tornou apenas um instrumento arrecadatório.
Essa prática contraria o princípio da retributividade, que sustenta qualquer sistema contributivo: quem paga deve receber algo em troca. No caso dos aposentados, a contribuição é apenas uma subtração injusta da renda de quem já fez sua parte.
Um peso social desnecessário
Grande parte dos aposentados e pensionistas vive exclusivamente de seus proventos. Retirar uma fatia significativa dessa renda significa comprometer sua qualidade de vida, especialmente num momento da vida em que as despesas com saúde, medicamentos e cuidados pessoais aumentam.
Além disso, essa contribuição reduz o poder de compra dessa parcela da população, com reflexos negativos no comércio e nas economias locais. É uma medida socialmente injusta e economicamente ineficiente.
Uma proposta justa e equilibrada
A PEC 06/2024 propõe uma solução sensata para corrigir essa distorção histórica. Seu texto prevê a redução gradual da contribuição em 1/10 a cada ano até a extinção total, permitindo que União, estados e municípios se adaptem financeiramente de forma responsável e previsível.
A proposta equilibra justiça social com responsabilidade fiscal, devolvendo aos aposentados e pensionistas o que é deles por direito: a integralidade dos proventos pelos quais contribuíram a vida inteira.
Justiça previdenciária e respeito à dignidade
Extinguir a contribuição previdenciária dos aposentados e pensionistas não é privilégio.
É ato de justiça, de coerência com o novo modelo previdenciário e de respeito à dignidade da pessoa humana.
Aqueles que dedicaram décadas ao serviço público merecem ser tratados com reconhecimento, e não com desconfiança fiscal. Corrigir essa distorção é restabelecer o equilíbrio entre gerações e reafirmar o valor do servidor público aposentado como pilar do Estado brasileiro.
A contribuição dos inativos cumpriu seu papel histórico. Agora, é hora de deixá-la no passado.
Miguel Arcanjo Simas Nôvo – Presidente da ANFIP Nacional