Benefícios previdenciários: Atrasos no pagamento, a Covid-19, a carência e as novas regras trazidas pela EC 103/2019 (Márcio Humberto Gheller)

2017

Márcio Humberto Gheller – vice-presidente Executivo da ANFIP

Uma das fortes preocupações nestes momentos de pandemia é com o represamento de benefícios previdenciários. Em tempos de on line, o INSS está funcionando off line.

Primeiro, falemos de tempos. Segundo a imprensa, existe um represamento de benefícios solicitados e não concedidos de quase dois milhões de pedidos. Isso mesmo, o equivalente a uma cidade grande do Brasil a espera.[1]

INSS fecha 2020 com 1,7 milhão de benefícios represados; tempo médio é de 66 dias para concessão

Desse total, 1,27 milhão esperavam pela primeira avaliação dos seus requerimentos e 486 mil já haviam passado pela análise e necessitavam cumprir exigências do INSS para serem pagos.

Resta evidente que os brasileiros estão sofrendo, há mais de um ano, acossados pela Covid-19 ou pelo vírus SARS COV-2, cuja cura e pesquisa de dados de sua origem estão a exigir o esforço da comunidade cientifica mundial, mas os brasileiros sofrem, especialmente os brasileiros comuns, os que trabalham todos os dias e são segurados da previdência social, e estão suportando uma redução das condições de trabalho e emprego, e passam por uma imensa dificuldade em manter seus rendimentos, trabalhando em home office ou não, tendo carteira assinada ou não.

Pois bem, criou-se acertadamente o auxílio emergencial para socorrer os trabalhadores sem renda, os informais, em situação de maior vulnerabilidade social decorrente da onda virótica que se espraiou sobre todas as nações do globo. Nada mais justo. Fontes oficiais[1] citam que somente em 2020, 65 milhões de brasileiros, ou seja, mais de sessenta por cento da PEA – População Economicamente Ativa, que em 2020 foi de 106,18 milhões de pessoas[2], receberam o auxílio emergencial no ano de 2020.

A pergunta que não quer calar é: Como o Estado Brasileiro consegue rapidamente fazer chegar aos lares desfavorecidos de brasileiros os recursos aos informais, e não consegue analisar os pedidos de benefícios dos que trabalharam e contribuíram para a previdência social?

ENDURECIMENTO DAS REGRAS PELA EC 103/2019 – Outra preocupação é com a exigência de carência para a concessão dos benefícios, carência que está calculada em tempos de não pandemia, mas que forçosamente precisam ser revistos nestas épocas de exceção.

Falamos dos mais vulneráveis, os desempregados e informais. Falemos agora dos vulneráveis, que trabalham e produzem renda dentro da carteira assinada, dos trabalhos como empreendedores individuais, que também foram afetados pela COVID-19.

Estes indivíduos, embora as empresas tiveram afrouxamento das regras trabalhistas e previdenciárias[3] decorrentes da pandemia, os segurados da previdência social não tiveram nenhum benefício no período de graça[4] e no tempo de carência[5] em relação aos benefícios que são devidos pela previdência social brasileira. O Orçamento de Guerra aprovado no parlamento não chegou até os trabalhadores.

Os dados referentes à população brasileira, regularmente são calculados pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. O Censo foi realizado em 2010 e não será realizado em relação ao ano de 2020 por contenção de despesas. Ok. Mas o Brasil real segue funcionando, com vontade crescer e se desenvolver.  E a seguridade social, neste período de instabilidade, precisa ser fortalecida e aperfeiçoada, para atender seus contribuintes, segurados e dependentes, brasileiros que querem e precisam que o Brasil dê certo.

Em detalhado trabalho sobre a Análise da Seguridade Social em 2019[6], a ANFIP detectou que “Em 2019 foi aprovada a Emenda à Constituição que cortou direitos e privatizou, em parte, a cobertura dos direitos previdenciários, tanto do regime geral quanto dos regimes próprios. E, quanto ao financiamento, essa emenda aumentou

exigências contributivas dos segurados e ampliou imunidades de importantes segmentos econômicos. No fundamental, precarizou parte das fontes vinculadas e exclusivas da Seguridade Social.”

A pandemia do Covid-19 torna imperativa a correção da rota. Aumentar o período de graça e reduzir o período de carência é fundamental, nestes tempos de crise, para demonstrar aos participantes que o Brasil honra seu sistema de seguridade social trazido pela Carta Constitucional de 1988. “Ai que saudades de Getúlio Vargas”, escreveu certa vez o ministro da previdência Jarbas Passarinho.

NOVAS REGRAS, NOVAS DIFICULDADES – Agora, um pouco de consideração ao direito posto, pois algumas alterações nas práticas de trabalho impactam, sobremaneira, a petição aos benefícios de previdência.

O primeiro aspecto que tem produzido muita incerteza para os contribuintes é o período de graça. Este instituto tem sido negligenciado em boa parte pelos segurados. Diz a lei que qualquer segurado mantem a qualidade de segurado por um ano, dois anos, no máximo três anos, e depois desaparece do espectro de proteção previdenciária. Aqui chamo bastante a atenção dos contribuintes, especialmente nos casos daqueles que perdem o emprego, o flexibilizam, ou mesmo passam a operar mais de um contrato de trabalho, alguns de valor inferior ao salário mínimo, que foi trazido pela Emenda Constitucional número 103/2019. Muito cuidado com este instituto, eis que o intermitente poderia ficar sem direitos a aposentadoria, pois que este tipo de benefício está atrelado a recolhimentos de valor igual ou superior ao salário mínimo, ficando tais recolhimentos inferiores numa espécie de limbo jurídico, que deverão ser enfrentados pelo judiciário.

Outro aspecto não menos importante é o período de carência. Quinze anos. Para a maioria dos benefícios, exceto os acidentários, que é de um ano. Pois bem. Este tem sido um impeditivo para muitos pedidos de prestação, pelo desconhecimento geral. Também os valores inferiores ao mínimo não atendem ao requisito da contagem para a carência, porque os serviços que têm contribuição feita sem continuidade, por horas, dias ou meses, e não respeitando o salário mínimo proporcional, encontram um obstáculo trazido pela reforma da previdência.

Lembramos a todos que a Emenda Constitucional numero 103 extinguiu a aposentadoria por tempo de serviço ou aposentadoria por tempo de contribuição para os casos futuros. Daí a enorme importância na discussão de carência para todos os contratos remanescentes.

Finalmente, alertamos aos leitores e demais segurados, que trabalham no Brasil e até mesmo fora dele, no entendimento dos requisitos para atendimento da legislação previdenciária e obtenção dos  benefícios a que o segurado tem direito criaram seis regras de transição, que podem servir de alento aos atuais segurados, tendo em vista a extinção do beneficio por tempo.

E nunca é demais lembrar o ditame constitucional de todos são iguais perante a lei, numa perspectiva que que a lei nova, a nova reforma da previdência, vai exigir muita análise, interpretação e estudo dos operadores do direito, para assegurar a tão propalada segurança jurídica.

[1] Disponível em https://www.gov.br/pt-br/noticias/assistencia-social/2020/07/auxilio-emergencial-alcanca-mais-de-65-milhoes-de-brasileiros, consulta em 26/04/2021.

[2] Disponível em https://www.gov.br/fazenda/pt-br/centrais-de-conteudos/publicacoes/conjuntura-economica/emprego-e-renda/2020/ie-pnadc-dezembro-2020.pdf, consulta em 26/04/2021.

[3]  Disponível em https://www.migalhas.com.br/depeso/322474/covid-19–tributacao-sobre-a-folha-de-salarios-e-fluxo-de-caixa, consulta em 26/04/2021.

[4]  Vide Artigo 15 da Lei 8.213/91.

[5]  Vide Artigo 24 da Lei 8.213/91.

[6]  Lançamento da obra, vide https://www.anfip.org.br/assuntos-tributarios-e-previdenciarios/previdencia/analise-da-seguridade-social-e-lancada-na-camara/, consulta em 26/04/2021.

[1] Disponível em  https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/01/19/inss-fecha-2020-com-quase-17-milhao-de-beneficios-represados-tempo-medio-e-de-66-dias-para-concessao.ghtml, consulta em 26/04/2021.