Cantinho da Conversa: ANFIP-CE entrevista o escritor Walter Parente

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 Em entrevista publicada no site da ANFIP-CE, no Cantinho da Conversa, a equipe de Comunicação Social da entidade entrevistou o escritor e auditor fiscal Walter Parente, ainda na ativa, vencedor do I Concurso de Contos, Histórias e Poesias promovido pela ANFIP.

Walter Parente é cearense de Ubajara, formado em Engenharia Agronômica, mestre em Economia Agrícola pela Universidade Federal do Ceará e especialista em Previdência Complementar. Especialista ainda em mercado financeiro e de capitais, tendo sido professor de Previdência Complementar no curso de pós-graduação em Direito Previdenciário da FIC-Faculdades Integradas do Ceará, hoje Estácio de Sá.

Quando você começou a escrever?
Walter Parente – O meu enveredamento pelos caminhos da literatura, como pretenso escritor, teve início com um fato prosaico acontecido em março de 2007. Certa vez, eu estava na sala vip da TAM do Aeroporto de Salvador (à espera de um voo para Ilhéus). De muito frequentar aquele ambiente, eu me tornei amigo do pessoal que ali trabalhava. Quando ali estava, eu matava o tempo lendo alguma obra literária, normalmente um romance. Certo dia, Jamile, uma das coordenadoras da sala, perguntou se eu, como assíduo leitor de livros, não a poderia ajudar na elaboração de uma historinha que abordasse aspectos de sua vida laborativa com a TAM. Com esse trabalho, ela concorreria a uma viagem à França. Pedi-lhe que me desse algumas informações. A greve dos controladores de voos, em plena efervescência à época, infligia aos viajantes longos momentos de espera, de modo que tive tempo de sobra para atender ao pedido de minha adorável amiga. Três horas depois, entreguei-lhe uma crônica. Alguns meses depois, eu recebi um telefonema dela, diretamente de Paris. Ela estava lá na companhia de seu amado Gilberto – um bom baiano de Itabuna. Empolgado, pus-me então a escrever, de forma espaçada, crônicas e contos, mas nunca os publiquei.

Mas você escreveu também um romance.
WP – É verdade. Em 2020 foi publicado meu romance de estreia, Galos insones. Foi um momento de muita preocupação para mim. A escrita de crônicas e de alguns contos me tangeu para esse caminho tortuoso, que, ao percorrê-lo, fui acometido, muitas vezes, do temor de que ele viesse a dar com um abismo. Um abismo onde eu, enquanto escritor em nascimento, seria irremediavelmente jogado.

E esse temor se confirmou?
WP – Graças a Deus, não. Em vez de fazer o lançamento do livro numa costumeira solenidade, preferi encaminhar o livro a alguns críticos literários e a um pequeno número de escritores conhecidos. A acolhida (resenhas) se mostrou bastante incentivadora. Houve aqueles que se disseram maravilhados com a obra. O renomado crítico literário Batista de Lima, professor e escritor, membro da Academia Cearense de Letras (ACL), expressou-se assim: “Walter Parente é auditor-fiscal da Receita Federal. Antes de tudo, porém, é escritor, dos melhores da nova safra de romancistas cearenses e quiçá do Brasil. Sim, porque esse seu primeiro livro, Galos insones, da Premius Editora, de 2020, traz 477 páginas de cativante narrativa que fisga o leitor, que ao mergulhar na primeira página só vem à tona na última. E não é fácil segurar um leitor de pouco fôlego em itinerário de tão longo curso. É uma revelação na arte de narrar e em um gênero de difícil consumo que é o romance. […]

Qual foi o tema abordado?
WP – O viver humano, com suas idiossincrasias. A ambientação no sertão cearense (fictício município de Paissandu) me facilitou o desenvolvimento de uma prosa poética. Nesse romance, há a abordagem das agruras humanas; a sua leitura nos conduzirá à conclusão de que o viver humano dos personagens, resultante da mescla do amor com a indiferença e com a mesquinhez, resultou em um mundo ficcional cinzento, da cor da caatinga quando a chuva é a primeira a se fazer de retirante.

Joacir Castelo, também auditor fiscal da RFB e escritor cearense, expressou-se, na orelha de seu livro, afirmando que, ao ler Galos insones, o leitor cria laços com as famílias e os moradores da fazenda Santo Antônio. Qual seria então a razão que leva o leitor a mergulhar tão profundo nesse romance?
WP – Sinceramente, eu não consigo apontar uma razão específica. O meu amigo e colega Joacir Castelo é um grande poeta amante da natureza, é o nosso Manoel de Barros. A escrita dele é o reflexo da alma de um homem puro e apaixonado pelo universo divino. Posso, contudo, conjecturar. E, assim fazendo, posso creditar parte dessa razão à forma como está descrito o viver dos personagens, com seus sonhos e com suas agruras; um viver que mostra uma acentuada verossimilhança com o nosso e, sobretudo, com o do sertanejo. Escrever sobre o sertão, seu povo e sua paisagem em constante transformação é escrever uma ode ao amor e uma elegia ao sofrimento de um povo explorado, mas que nunca desiste; um povo que está sempre rebrotando com os primeiros pingos da chuva, como faz o marmeleiro. Talvez seja essa a razão.

Onde esse livro pode ser adquirido?
WP – Na plataforma Amazon (e-book) e na Livraria Leitura do Shopping RioMar.

Você tem pretensão de escrever outro romance?
WP – Tenho, sim. Na verdade, eu já o iniciei.

Qual será o tema abordado?
WP – O indivíduo humano e a sociedade em que ele está inserido, com suas vicissitudes.

Como é seu processo de criação?
WP – Por ser um iniciante, eu não tenho ainda um processo criativo consolidado. Ainda há o fato de que continuo na ativa, de modo que não disponho de muito tempo para me dedicar à arte literária. O certo é que vou procurando tirar o maior proveito do pouco tempo que vou dispondo. Escrevo em casa, nos aeroportos, em avião, em hotéis, em suma, em lugares em que disponho de algum tempo livre. Contudo, nunca me desprego de meu bloquinho de anotações, onde registro os fatos e os insights que vão brotando e que poderão servir de base para a tessitura de alguma obra (ensaio, crônica, conto ou romance). Faço isso motivado por um conselho que me foi dado pelo grande Ariano Suassuna. No que toca especificamente ao processo de criação, eu primeiro procuro elaborar uma sinopse da história, para em seguida fazer a estruturação da narrativa. Nunca deixo de elaborar um quadro de apoio.

Se inspirou em alguém, em outro escritor? Quem é seu escritor preferido?
WP – Evidentemente que me inspirei em alguns escritores. A meu ver, não há como não ser assim. O processo de leitura irremediavelmente antecede o da escrita, isto é, por trás de um bom escritor está um contumaz leitor. Isso não quer dizer, no entanto, que o inverso irremediavelmente aconteça. No meu caso, a inspiração para escrever veio, em grande parte, da leitura de grandes obras de autores que eu muito admiro, tais como: Machado de Assis, Aluísio Azevedo, Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz, Antônio Sales, Moreira Campos, Natércia Campos, Lev Tolstói, Dostoiévski, Victor Hugo, Franz Kafka, Gabriel García Marques… A lista é grande, é quase infindável; mas há um que conta com a minha profunda admiração: Mario Vargas Lhosa. Posso dizer que o seu romance A guerra do fim do mundo foi o meu modelo de escrita. Nessa obra, o autor mescla, com maestria, a ficção com a realidade. Ressalto, porém, que ter um autor como modelo não significa copiá-lo, tampouco deixar de ser original.

Quantos livros você pretende escrever?
WP – Não sei quantos, mas tenho certeza que serão muito poucos. Escrever um romance ou um conto é criar mundos. E criar mundos é coisa complicada; descrevê-los de forma literária é ainda mais complicado. Uma obra para ser literária há de ser universal, ou seja, sem fronteiras geográficas e temporais. E para que isso aconteça, o escritor tem de ser um profundo observador e meditador. Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz e Clarice Lispector afirmaram, embora de formas diferentes, que, para se chegar a um texto depurado, primeiro se escreve em abundância para, em seguida, ir tirando, tirando, tirando… até o texto ficar bem limpo, enxuto. E, ao se fazer isso, demandam-se tempo e paciência. É assim que eu faço. Gosto de seguir os conselhos dos grandes mestres.

Considerando que, a seu ver, por trás de um grande escritor está um contumaz leitor, que mensagem você direcionaria aos jovens de hoje?
WP – Eu lhes diria que a leitura de um livro nos permite visitar mundos, sem que saiamos de casa, em viagens de exploração que nos levam ao infinito universo do conhecimento e da sabedoria. O ato de leitura é vital; ele é necessário à mente tanto quanto os atos de comer e beber o são para o corpo. Neste ponto, não me refiro apenas à leitura de obras literárias; a leitura de qualquer texto trará inevitavelmente seu contributo à nossa formação cultural. Por fim, eu concluiria afirmando que o hábito da leitura não é base apenas para a profissão de escritor; ele também o é para a edificação da vida humana.

Você foi o grande vencedor do primeiro concurso literário da ANFIP.
WP – Fui, sim. Obtive o primeiro lugar com o conto Distopia. Para minha surpresa, fui ainda agraciado com as menções honrosas por ter obtido o quarto e o quinto lugares, respectivamente, com os contos Espinhos da alma e O nascimento de Aristeu. Fiquei muito feliz e me senti muito honrado com o meu feito. Isso porque estou consciente de que concorri com colegas altamente talentosos, cujos trabalhos inscritos se mostraram de grande valor literário. A meu ver, não fui eu o único vencedor; todos os participantes o foram, de modo que aproveito essa oportunidade para parabenizá-los. Todavia, parabenizo, sobretudo, a ANFIP pela oportuna inciativa e pela forma competente que conduziu, em todas as suas fases, esse profícuo concurso. Espero que ele venha a fazer parte do calendário de suas atividades nos anos que advirão.

Qual de seus contos inscritos no concurso ANFIP recomendaria como de leitura prioritária?
WP – É muito difícil para um pai dizer qual é o filho que é mais de seu agrado. Meus contos são meus filhos. Amo-os com igual intensidade. Os três são, para mim, igualmente prioritários.

Quer deixar uma última palavra?
WP – Afirmo que a iniciativa da ANFIP foi demasiado oportuna, pois nos fatídicos momentos de lock down (pandemia Covid 19), ao escrever os contos, pude sair de casa voando nas asas do pensamento.

Fonte: ANFIP-CE