Previdência Social e cidadania (Floriano José Martins)

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A Previdência Social, esta senhora que completa 100 anos no dia 24 de janeiro, mostra-se cada vez mais atuante, principalmente nos lugares mais distantes do Brasil. Grande e bela construção humana, a Previdência Social delimitou o marco da civilização na história da humanidade, e sua importância não pode ser resumida – como é feito com inquietante frequência – a um balanço entre receitas e despesas objetivando lucros.

Entretanto, ela sempre foi, e é, objeto de conflitos e opiniões. Para uns, há um enorme déficit do Estado para com a sociedade; para outros, cumpre o seu papel de garantir o mínimo. Uns reclamam pela extensão de mais benefícios e outros da alta taxação. Porém, a vida coletiva não pode ser pautada pelo ato individual.

Um país com ranking das nações mais desiguais do mundo, no tocante à concentração de renda, deve buscar uma política pública em benefício dos menos assistidos. Nesse contexto, a Previdência Social, como elemento de política pública, deve ter sua missão pautada num sistema solidário que entra como instrumento de redistribuição de renda.

Por outro lado, os 100 anos são marcados por reformas constantes e fortes pressões políticas, e por uma luta incansável de seus defensores, passando a partir da Constituição Federal de 1988 a articular-se com outras duas fundamentais políticas, a da Assistência Social e a da Saúde, formando a chamada Seguridade Social, estabelecendo o financiamento, por diversas fontes de custeio, conforme determinação do art. 195.

Os opositores do sistema estatal de Seguridade Social apontam para a insolvência ou, ainda, a ineficiência do sistema, porém, nada é dito sobre os gastos financeiros – custo dos juros da dívida – que são tomados enquanto fato natural, como se não resultassem de decisão política e não pudessem ser afastados. É necessário que todos tratem a Seguridade Social e, principalmente, a Previdência Pública, não como um comércio, uma fábrica ou um banco que tem de apresentar lucros ou superávits a cada exercício, qualquer que seja o sacrifício imposto aos trabalhadores e contribuintes, mas sim como um sistema de política social, solidário e equânime.

A Previdência Social mantém 37 milhões de benefícios, porém auxiliando cerca de 90 milhões de brasileiros, o que dá a exata dimensão de sua grandiosidade. Das 5.565 cidades brasileiras, em 3.774, ou 67%, os repasses da Previdência são superiores ao FPM (Fundo de Participação dos Municípios), dados que são altamente representativos de uma realidade que não pode ser ignorada: a Previdência Social reduz as desigualdades sociais e exerce uma influência extraordinária na economia de milhares de municípios brasileiros. Sem ela, certamente teríamos muito mais brasileiros abaixo da linha de pobreza.

Mesmo assim, essa senhora tem, ao longo dos anos, se mostrado muito ativa, levando para a população um pouco da cidadania tão almejada por todos nós. Que o dia da Previdência seja, acima de tudo, de reflexão consistente sobre um sistema intimamente relacionado ao futuro da coletividade, ao alento à redução das desigualdades sociais e ao pleno exercício da cidadania e da justiça social.

* Membro do Conselho Curador da Fundação ANFIP de Estudos Tributários e de Seguridade – E-mail: fjm53@yahoo.com.br