IVA na Espanha reduziu distorções e ampliou abrangência do tributo

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O vice-presidente de Estudos e Assuntos Tributários da ANFIP, Gilberto Pereira, recebeu o auditor fiscal e conselheiro de Finanças da Embaixada da Espanha, Francisco Javier Sánchez Gallardo, em live realizada nesta quinta-feira (18/5) para debater o modelo de tributação através do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), adotado pela Espanha, desde 1980, e que pode ser implementado no Brasil.

A mudança é analisada pelo Congresso Nacional e foi apresentada por meio das Propostas de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019 e 110/2019. Na primeira, o IVA passa a ser o imposto único, em substituição ao PIS, Cofins e IPI federais, além do ICMS estadual e do ISS municipal. Já a PEC 110 propõe um modelo dual, com IVA federal e outro subnacional, juntando o ICMS e o ISS.

Gilberto Pereira afirmou que a reforma tributária no Brasil é importante para a economia do país, para atender uma demanda da sociedade que exige um sistema menos complexo e lembrou que essa tentativa de mudar o modelo de impostos já se arrasta por mais de 30 anos. “Nesse debate, queremos saber qual a experiência da Espanha com o IVA e o que levou o país a implementar o IVA”.

Gallardo, que também é economista e doutor em Direito, explicou que foi um processo complexo. “Não é uma reforma fácil e tinha um contexto, que era a necessidade da reforma, que vinha se falando desde os anos 80, quando se implantou o IVA na Espanha.” Ele também informou que o modelo tributário foi planejado e, inclusive, já era adotado em outros países. “O IVA, neste contexto, parecia uma alternativa interessante. Um imposto que poderia dar muitas vantagens ou eliminar muitas distorções da concorrência que, na época, existia em meu país”, disse.

Outra circunstância determinante, segundo o auditor fiscal espanhol, foi a entrada da Espanha na União Europeia, antes chamada de Comunidade Econômica Europeia. “Não tinha como não fazer. Espanha e Portugal entraram na União Europeia em 1986 e uma parte importante da entrada desses dois países era aceitar o acervo comunitário, ou seja, o sistema tributário que, por normas europeias, os países da UE tinham que ter. E um desses impostos era o IVA”, esclareceu Gallardo.

Na avaliação do conselheiro da Embaixada da Espanha, essas mudanças foram positivas. “Isso foi muito importante para meu país. Primeiro, porque obrigou qualquer resistência que tivesse com a implantação do IVA a ser descartada, não tinha como não adotar, era uma obrigação. Mas, ao mesmo tempo, também foi obrigatório aplicar o IVA europeu”, enfatizou.

Antes da adoção do IVA, Gallardo contou que a Espanha tinha muitos impostos, mais ou menos abrangentes, e que geravam muitas distorções; não eram iguais aos do Brasil, mas semelhantes. Com o IVA, a mudança na Espanha gerou, basicamente, três coisas: resumiu em um único imposto o consumo, tirando o que seria o imposto seletivo; ampliou a abrangência do tributo, incluindo no fato gerador áreas econômicas de setores e atividades que não estavam sendo tributados; e promoveu o crédito tributário, que, sobretudo, tirou do caminho a penalização do investimento empresarial.

Mesmo que tenha reduzido as distorções no sistema de impostos, o auditor fiscal ressaltou que o IVA não é perfeito. “Nada é perfeito, mas não distorce a concorrência, o mercado e faz com que o sistema tributário tenha um funcionamento razoável quanto à imposição sobre o consumo.”

Sobre a aplicação de alíquota única de imposto e a implementação do sistema de cashback (devolução de parte do imposto pago), modelo que o Brasil estuda para implementar no país, Gallardo explicou que a Espanha tem várias taxas, várias alíquotas, “o que não significa que seja bom”. “É importante dizer que na Espanha não existe um sistema de cashback como redistribuição de renda”, pontuou. Ele acredita que a alíquota única faz sentido se existir um sistema de cashback para as pessoas com renda baixa. “Aí sim é coerente, porque, evidentemente, ameniza a carga tributária para estas famílias que têm renda reduzida. Isso na Espanha não existe, infelizmente”.

A redução da carga tributária espanhola, segundo o especialista, é feita por meio de alíquotas reduzidas. “Quando tem uma taxa reduzida para frutas, legumes, leite, para alimentação básica, essa redução é usufruída tanto pelas pessoas que têm uma renda menor, quanto por famílias que têm uma capacidade econômica superior, o que é intrinsecamente injusto”, lamentou. O auditor fiscal também informou que, após a pandemia da Covid-19, seu país criou muitas taxas, devido ao impacto econômico. “Muitos países reagiram reduzindo a taxa do IVA. Então, a Espanha tem taxas reduzidas para alimentação básica, para serviços básicos e também tem outras taxas reduzidas importantes, é conveniente também destacá-las, quanto ao setor turístico”, acrescentou Gallardo.

O conselheiro financeiro elogiou o sistema de cashback e acredita que o Brasil tem condições de implementar este modelo. “O cashback precisa de uma administração que funcione muito bem, uma administração que seja desenvolvida e que, honestamente, acho que o Brasil tem. Tanto a Receita quanto as secretarias fazendárias estaduais e municipais brasileiras são exemplares e isto é fato, é reconhecido internacionalmente”, relatou.

Gallardo também comentou que o número de auditores fiscais na Espanha é baixo e tem diminuído ao longo do tempo e destacou a importância da autonomia das administrações tributárias. “Na Espanha, a condição do auditor fiscal não está sendo fácil ultimamente. O concurso é muito semelhante ao que tem no Brasil. E nós auditores fiscais temos um perfil muito semelhante. Não é todo mundo que consegue ser auditor fiscal e é uma coisa que você consegue por mérito. Depois nós temos responsabilidades e independência, sobretudo do poder político”.

O debate completo está disponível na TV ANFIP, no Youtube. Clique aqui para assistir.

Acompanhe também todas as informações sobre a Reforma Tributária no hotsite criado pela ANFIP. Acesse em https://www.anfip.org.br/reforma-tributaria/.