FIT 2021: Tribuna aberta encerra primeiro dia do evento

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Encerrando o primeiro dia do Fórum Internacional Tributário, que teve início nesta quarta-feira (20/10), foi realizado debate em tribuna aberta para manifestação de agentes públicos sobre tributação e desigualdade no Brasil. A mediação foi do vice-presidente do Sinafresp (Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo), Glauco Honório.

O secretário da Fazenda do Estado do Maranhão, Marcellus Ribeiro Alves, esteve presente e compartilhou medidas adotadas no seu estado para tornar a tributação menos regressiva. “No Maranhão, conseguimos destinar parte do ICMS diretamente para atender as necessidades das pessoas carentes, buscando enfrentar um problema muito grande que temos no nosso estado que é a mortalidade infantil”.

Na avaliação de Alves, qualquer reforma tributária que seja discutida, hoje, precisa enfrentar três problemas: regressividade do sistema, tributação sobre renda e propriedade e o Pacto Federativo. “Você tem um grande volume de atribuições dos estados e municípios que não é compatível com o que se arrecada”, afirmou.

O secretário também comentou as propostas que tramitam no Congresso Nacional, que visam a simplificação do sistema tributário brasileiro. “O problema não é a simplificação do sistema, é que você vai esconder dentro dessa simplificação a necessidade de enfrentar a regressividade da tributação no país, que é o principal problema. Se não diminuirmos a tributação sobre o consumo, de fato, não vamos enfrentar o principal problema, que é a regressividade. Então, temos que ficar atentos para não cairmos nessa armadilha”, ressaltou Marcellus Alves.

Ciro Gomes, vice-presidente do PDT, avaliou que estamos vivendo um momento peculiar e, na questão tributária, parece um tema sem consenso. “Não conheço unanimidade que afirme que o país não precisa de uma reforma tributária. A pergunta que se faz é: se existe esse consenso, por que ela nunca acontece? Por que o sistema persiste com distorções provocando graves injustiças?”, questionou. Para Ciro, o consenso é raso, pois se debruça sobre manchetes e, a partir dessas manchetes, o sistema estabelece um jogo para impedir que as coisas fiquem esclarecidas. Além de um novo projeto, Ciro Gomes acredita que é preciso também de profundas mudanças na administração tributária e na repartição de receitas. E conclui: os conflitos políticos inibem que se faça uma reforma tributária no Brasil. Somado a esses conflitos, existe o que o vice-presidente classificou de “emaranhado normativo”. “Esse emaranhado de leis não é acidente de percurso. Acredito que existe para criar brechas para a elisão fiscal, o que se chama de planejamento tributário”, constatou.

Para Ciro Gomes, a reforma se impõe para por fim à guerra fiscal, a fim de se garantir que os tributos sobre o consumo sejam cobrados no destino. Desta forma, acredita, o cidadão, no ato de pagar o tributo, adquire também consciência enquanto contribuinte. “Temos cinco tributos sobre valor agregado. Aqui já está uma questão: por que o Brasil não tem IVA? Nossa forma de se desenvolver se concentrou em estados que detém a produção industrial brasileira. Ao cobrar no destino, encerra o crédito na origem e desfinancia estados importantes que já passam por situação frágil”, avaliou. O vice-presidente acredita que, em busca de um sistema correto, é preciso redesenhar o pacto federativo. “Só assim se viabilizará uma solução. Só vamos fazer isso se restaurarmos a capacidade de investimento. Precisamos avançar para a neutralidade do sistema”, disse.

O Brasil, segundo ele, precisa ainda rever as renúncias fiscais. “Neste momento de crise, em que se transfere para os preços [ao consumidor], estamos assistindo algo ao redor de R$ 340 bilhões em renúncias. Sem contrapartida nenhuma, sem agregar valor para a sociedade. Há renúncias para itens da cesta de alto consumo. A reforma é necessária”, reafirmou. E concluiu afirmando: “o Brasil tem que buscar progressividade maior. Antes de encontrarmos os limites estratégicos de modelo tributário, precisamos de um fisco profissional, autônomo, com clareza da realidade econômica do país”. Ciro Gomes alertou que, de acordo com dados do Banco Central, brasileiros remeteram US$ 250 bilhões para o exterior. Na Receita Federal está contabilizado US$ 50 bilhões. “Não é para devassar a vida ninguém. É para a administração tributária conhecer a sua base”, destacou.

O senador Roberto Rocha (PSDB-MA) chamou de um “verdadeiro manicômio” o sistema tributário brasileiro e defendeu a simplificação do sistema, com a criação do IVA-dual, que cria um tributo de competência dos estados e municípios e outro da União. O parlamentar é relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 110/2019, e apresentou seu parecer no dia 5 de outubro. Em seu relatório, está prevista a criação de dois impostos: o IBS, que será de competência dos estados e municípios; e ISS, ICMS e a CBS, da União, que reuniria Cofins, Cofins-importação e PIS. Prevê ainda a criação de um imposto seletivo sobre bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. “Como o Brasil é um país muito grande, com diferenças regionais muito grandes, foi pensado o IVA-dual, para atender essas diferenças”, justificou.

Rocha também defendeu mudar a tributação sobre o consumo. “Os mais pobres usam toda a renda no consumo. Precisamos mudar essa base tributária sobre o consumo, que é a mais urgente”. Para ele, é preciso reduzir e simplificar os impostos. “Temos uma carga tributária altíssima, que faz com que o brasileiro tenha que trabalhar quatro meses para o governo por ano e não tem contrapartida. Na Alemanha a carga tributária é maior, mas tem a contrapartida”, avaliou.

Ainda sobre tributar o consumo, o parlamentar acrescentou: “precisamos rever o sistema. Não podemos continuar rastreando só o produto, precisamos rastrear o dinheiro. Com a reforma [PEC 110], a gente pode fazer o investimento social mais justo. É o que todos queremos. Esses impostos [sobre o consumo] massacram o mais pobre. Quem paga imposto é o consumidor, empresa não paga imposto. A reforma tributária, na minha visão, é a melhor forma de combater a pobreza e gerar riqueza”.

Aloizio Mercadante, presidente da Fundação Perseu Abramo, também se manifestou na tribuna e ressaltou que a reforma tributária e a política fiscal precisam ser politizadas. “Temos que envolver a sociedade. Estamos discutindo como é que o Estado vai se apropriar de um recurso e devolver para o cidadão”, disse. Ele acredita que o cenário pós-pandemia é parecido com o que foi o pós-Segunda Guerra Mundial, quando aumentou a demanda da população por saúde e educação. “Não precisamos de menos Estado, precisamos de mais Estado, que vai ser o condutor da saída das crises econômica e social”.

Segundo Mercadante, a Reforma Tributária precisa ser feita sob o ponto de vista econômico, além de combater a concentração de riqueza do país. “Rico precisa pagar imposto nesse país. Temos uma concentração de riqueza jamais visto. Já fui deputado, senador, ministro de três pastas e já acompanhei muita reforma tributária. E porque a reforma tributária não anda? Porque os interesses contrários são muito poderosos. Precisamos mexer nos impostos indiretos. Vamos caminhar para aquilo que já está consolidado, que é o IVA. Tem que ser um IVA-Dual, tem que ter uma alíquota para os estados e uma para a União”, defendeu. Ele finalizou dizendo que é preciso tornar o país mais justo e solidário.

O FIT 2021 continua nesta quinta-feira (21/10), com início das atividades às 9 horas. Acesso o site do evento (forumfit.org.br) e confira a programação completa. A ANFIP segue acompanhando o debate, com participação presencial, em São Paulo, e virtual.