Especialistas explicam impactos e tramitação da Reforma Administrativa

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Para esclarecer o que muda para os servidores públicos com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/2020, da Reforma Administrativa, a ANFIP e a Fundação ANFIP realizaram, nesta quinta-feira (24/9), um debate on-line com o professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e advogado Juarez Freitas e com o cientista político Jorge Ramos Mizael, sócio da Consultoria Metapolítica.

Margarida Lopes de Araújo, presidente da Fundação ANFIP, explicou os objetivos do debate virtual: “neste momento de Reforma Administrativa, que tanto angustia os servidores, nós não poderíamos deixar de fazer esta reunião, até mesmo para esclarecer os nossos associados sobre como vai ser essa reforma e no que ela vai impactar os atuais servidores e os que virão. O que pretendemos com esta live é construir alguma coisa que possa interferir nesta PEC, com emendas que possam minimizar falhas e prejuízos para os servidores”.

Vilson Antonio Romero, assessor de Estudos Socioeconômicos da ANFIP, que fez a mediação, ressaltou que o evento on-line visou detalhar os diversos aspectos envolvendo a PEC 32/2020, entregue pelo governo federal ao Congresso Nacional, em 3 de setembro. “Vamos saber quais as mudanças que ocorrerão na relação entre servidores e administração pública e quais os passos da tramitação da PEC no Congresso, como análise da atual conjuntura política e das articulações que estão sendo desenvolvidas tanto por entidades que defendem o serviço público e os funcionários quanto pelos parlamentares das mais diversas posições políticas”.

Impactos

Segundo o professor Juarez Freitas, uma reforma administrativa deveria ser feita buscando zonas de convergência e no sentido de modernizar a gestão pública do país. “Eu considero fundamental buscar, no Brasil, a modernização da gestão pública. Acho que há consenso entre os 11 milhões de servidores ativos no Brasil, aproximadamente, e um consenso na sociedade. A digitalização [no serviço público] deveria ser um consenso. A digitalização includente, com avaliação continuada das políticas públicas pelos usuários, por meio de aplicativos. Nós tínhamos que procurar temas como esse para fazer a modernização”.

Ele lembra que a pandemia mostrou, com evidência, que não dá mais para ter uma gestão pública analógica, baseada em papel, que é preciso partir para uma digitalização includente, com teletrabalho regulado. “Esses são pontos cruciais que deveriam ser consenso e que podem ser estabelecidos numa reforma que seja dialogada, feita com calma”, afirmou, ao defender, ainda, a desburocratização acentuada da gestão pública brasileira. “É inegável que nós temos, no processo administrativo, uma série de gargalos que podem e devem ser eliminados”.

Outro ponto apontado pelo palestrante é a valorização do funcionalismo brasileiro. “O servidor público não vai melhorar se for tratado como inimigo, com avaliação de desempenho sob ameaça. Nada disso funciona, isso contraria as chamadas ciências comportamentais. Ninguém produz bem, sobretudo na era digital, que é a era da criatividade, com base nisso”, ressaltou o professor. Nesse contexto, ele também ponderou: “A inteligência artificial não poderá jamais ser vista como dispensando a supervisão humana”.

No texto da PEC 32/2020, Juarez Freitas apontou alguns problemas, que trazem grande preocupação: “a alteração do artigo 84 da Constituição Federal afetará muito o servidor público brasileiro. As pessoas jurídicas de direito público são criadas por lei específica. Portanto, só poderão ser extintas por lei específica. Aí vem a PEC e diz que um decreto, ato privativo do presidente da República, pode extinguir, não só alterar, não só fundir, extinguir pessoas jurídicas de direito público por decreto. Gera insegurança jurídica”, explicou, dando como exemplo que, por essa lógica, um futuro presidente da República poderia, inclusive, extinguir um órgão como o Banco Central ou Ibama por meio de decreto. “Olha a instabilidade que isso gera! Totalmente desnecessária. Esse artigo 84 vulnera, frontalmente, o artigo 60 da CF, sem nenhum benefício substancial, só para acelerar a privatização”.

Juarez Freitas sugeriu que os servidores públicos apresentem propostas e busquem o diálogo. “Não é bom ficar numa postura reativa, é preciso apresentar propostas. Vamos propor o que nós consideramos aceitável. Nós temos que assumir o protagonismo, não ficar só na reatividade, numa postura de aguardar o que vai acontecer. Temos que propor, que procurar os parlamentares, o governo, a sociedade. Vamos reformar, mas com modos, com respeito à dignidade dos servidores públicos e das suas atribuições inerentemente estatais. Se não tivermos instituições de Estado, não há desenvolvimento duradouro”, afirmou.

Tramitação

O cientista político Jorge Ramos Mizael apresentou um panorama dos passos regimentais da PEC e da conjuntura política no Congresso Nacional, expondo também as principais mudanças que virão com a aprovação do projeto, entre as quais se destacam o fim do Regime Jurídico Único (RJU) e do instituto da estabilidade.

Para o especialista, sempre que uma proposta impactante como esta é apresentada ocorre uma avaliação eufórica das autoridades que esperam que haja uma tramitação rápida, mas há outras matérias que estão na frente para a votação e podem dificultar a  tramitação da reforma, como a PEC da Regra de Ouro e a Reforma Tributária. Jorge Mizael afirmou que, a menos que o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), interfira diretamente, a Reforma Administrativa não terá espaço para tramitação em 2020.

Porém, Jorge Mizael destacou que a política em sua natureza não segue essencialmente uma lógica matemática e estatística, portanto, não é o momento correto para a sociedade se desmobilizar. “É importante que os movimentos sindicais e associativos também se imponham como protagonistas em sugestões e solicitações”, frisou.

Ainda no debate, Vilson Romero informou que o grupo parlamentar do Fórum Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), com a assessoria da Metapolítica, estabelecerá os principais pontos que serão objetos de emenda. “É necessário pensar como podemos atuar nesta proposta para que, em vez de cargos típicos de Estado, possamos manter o conjunto dos servidores que exercem atividades exclusivas de Estado, além de como defender e mitigar uma eventual cizânia política no seio das carreiras típicas”, ressaltou.

Todos os pontos analisados pelos especialistas no debate podem ser revistos na live completa. Acesse AQUI ou clique no vídeo abaixo: