FIT 2021: Especialistas debatem perspectivas da Reforma Tributária

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O primeiro painel do Fórum Internacional Tributário, que acontece nesta quarta-feira (20/10), em São Paulo, abordou “as perspectivas da Reforma Tributária brasileira à luz da experiência Internacional no atual cenário de crise”, contando com participação de autoridades e parlamentares para apresentar suas visões sobre o modelo de impostos do Brasil. Os presidentes da ANFIP, Décio Bruno Lopes, e da Fenafisco, Charles Alcantara, coordenaram o debate.

O primeiro palestrante a se pronunciar foi o secretário Especial da Receita Federal do Brasil, José Barroso Tostes Neto, que elogiou a realização do FIT e ressaltou a importância do tema tributação e desigualdade. Tostes explicou que, entre as principais funções do Estado, está a distributiva, cujo objetivo é a redistribuição de renda. “É dever do Estado combater a desigualdade para que o cidadão tenha qualidade de vida”, declarou, ao afirmar que o Estado e as Administrações Tributárias precisam assegurar o caminho para a justiça tributária, “procurando assegurar um princípio básico, que é a progressão tributária”.

Em relação à tributação sobre o consumo, o secretário da RFB disse: “é, sem dúvida, uma das tributações mais complexas e desiguais do mundo. Representa 45% da arrecadação tributária do país, é quase a metade da arrecadação federal e, todos nós sabemos, é regressiva”. Para Tostes, neste momento em que se discute a reforma do sistema tributário, é uma oportunidade para mudar a regressividade sobre o consumo. Ele também defendeu as propostas que visam a simplificação dos tributos. “Vai favorecer o ambiente de negócios, a geração de emprego que tanto o país necessita e a transparência”, afirmou.

Também em sua exposição, o secretário da RFB comentou a proposta de reforma do Imposto de Renda, aprovada na Câmara dos Deputados e em análise no Senado Federal. “A proposta traz importantes avanços, visando elevar os investimentos e reduzir as distorções e privilégios, aí sim, promovendo a justiça fiscal. Essa medida favorece a todos os 32 milhões de declarantes”. Segundo Tostes, as mudanças promovidas pela reforma do IR tornam a tributação mais justa e estão alinhadas aos demais países do mundo. “Não temos dúvidas de que é uma proposta que vai sim promover uma justiça fiscal e a progressividade”.

Henrique Meireles, secretário da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo, também fez parte da mesa de debates e defendeu que “o tributo é o que permite ao Estado cumprir as suas obrigações básicas com a população, com saúde, educação, segurança e todas as outras obrigações cumpridas pelo Estado”. Meireles também explicou que o país precisa aumentar a sua produtividade, para aumentar a arrecadação federal, por meio dos tributos. “Não há dúvidas de que o nível de produtividade do Brasil tem caído nos últimos anos”.

Sobre o sistema tributário brasileiro, o secretário da Fazenda de SP considera muito complexo e burocrático e citou estudo do Banco Mundial, onde diz que no Brasil gasta-se cerca de duas mil horas por ano para pagar imposto. “Os impostos sobre o consumo são aqueles que geram a maior complexidade”, afirmou. Ele também defendeu propostas que promovam a simplificação do sistema.

Fernanda Macedo Pacobahyba, secretária da Fazenda do Estado do Ceará, analisou o país no cenário mundial de avanços para a redução da desigualdade. Um país, conforme frisou, jovem em relação às revoluções mundiais baseadas na liberdade, igualdade e fraternidade. “É importante compreender de que forma esses ideais vão afetar os milhões de brasileiros. Esse discurso da simplificação, da automação, com o fim de diminuir o tempo que se gasta, é focado no mercado. Será que as empresas também não gastam tempo pensando em como não pagar tributos?”, questionou. Para Pacobahyba, a sonegação afeta grandes grupos estruturados. “A gente tem uma distância entre teoria e prática no ideal de justiça fiscal. A injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça em todo lugar. A pandemia mexeu muito com a gente.  Não acredito numa vida em sociedade feliz enquanto estivermos vendo as coisas grotescas que temos visto”, disse.

A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ), autora da Emenda Global 178, da Reforma Tributária Justa, Solidária, Progressiva e Sustentável, apresentada em 2019, afirmou que a primeira palavra que tem utilizado nos fóruns em que participa é solidariedade. “Não é fácil enfrentar o que temos enfrentado nessa pandemia”, disse. Feghali destacou que o tema Reforma Tributária não é apenas um termo técnico. “Expressa um conceito de Estado e de sociedade, expressa um conceito democrático de sustentabilidade humana. O debate não pode se restringir à simplificação de tributos. Estamos discutindo de que forma a sociedade contribui para que o conjunto da sociedade possa viver e encarar sua capacidade de se estabelecer como cidadão, com igualdade de direitos e de acesso a bens e serviços”, frisou.

Para a parlamentar, o mundo todo percebeu como a pandemia escancarou sua capacidade de promover desigualdades profundas. “O número de pessoas em risco de fome dobrou no mundo. O Banco Mundial diz que são 150 milhões de pessoas em situação de extrema pobreza no mundo todo. Essa é uma realidade que expressa o mundo capitalista. Não estamos falando de pouca coisa”, afirmou. Feghali ressaltou ainda que, ao se falar na questão tributária, se traz ao debate os super ricos, que enriqueceram ainda mais durante a pandemia. E lembrou: esses super ricos não são tributados. “Estamos falando de uma questão política e esse deve ser o debate que precisamos fazer. Não tenho nada contra simplificação tributária, somos a favor, o problema é qual o sentido da tributação. É preciso discutir à luz da profunda desigualdade que existe no Brasil. A tributação progressiva não avançou aqui”, lamentou sobre a não tributação sobre patrimônio e renda. Os pequenos avanços, segundo a deputada, foram conseguidos na Reforma do Imposto de Renda, com a tributação dos lucros e dividendos e a mudança na tabela do IRPF. Porém, alertou que, no Senado Federal, esses pequenos avanços correm risco. “Precisamos encarar a tributação na ótica do desenvolvimento, do bem-estar social, do equilíbrio federativo e da superação das desigualdades. Não vamos conseguir isso só pela ótica da simplificação. A saída está no plano da política”, ressaltou.

O deputado federal Afonso Florense (PT-BA), também comentou o trabalho realizado dentro do Congresso Nacional, e junto aos governadores estaduais, em defesa da Emenda Substitutiva Global 178/2019, que contou com mais de 200 assinaturas de parlamentares, de diversos partidos. O parlamentar criticou, ainda, que outras propostas em tramitação no Legislativo, como as PECs 110/19 e 45/19, não abordam as mudanças contidas na Reforma Tributária Justa, Solidária, Progressiva e Sustentável e não tratam da tributação sobre lucros e dividendos. “O Brasil não pode continuar na contramão do mundo. Temos que aprovar a Emenda Global Substitutiva”, disse, ao criticar a isenção sobre lucros e dividendos e defender o movimento pela tributação dos super ricos.

André Horta, diretor do Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados (Comsefaz), relembrou o trabalho feito com a ANFIP e a Fenafisp, em 2017, a Reforma Tributária Solidária, que lançou as bases para um debate sobre a progressividade no sistema. Horta questionou se de fato a tributação dos lucros e dividendos reduz os investimentos. Deu exemplos de países em que a tributação de lucros e dividendos distribuiu mais lucros e não teve efeito sobre o emprego, como nos Estados Unidos e Irlanda. O diretor enfatizou que, quando se tributa menos os ricos, se aumenta a desigualdade. “Tudo parece endossar essa agenda de progressividade. Não é por menos, pois progressividade tem muitas virtudes; a moral é uma”, citou. Pesquisa da Oxfam com o Datafolha, conforme revelou, mostra que 84% dos brasileiros apoiam tributar os mais ricos para se dar serviços e benefícios aos mais pobres. Diante dessa perspectiva, Horta deixou alguns questionamentos: “se tanto concorrem a favor da progressividade, por que a gente não consegue fazer valer? Como resolveremos a questão da desigualdade? Como a gente faz para que essa vontade dos brasileiros se expresse em termos de eleger aqueles que vão fomentar isso?”. O FIT, disse, é o encontro do diálogo e da informação, para descobrimos soluções para sair desse vácuo entre a vontade abstrata e o ato concreto.

O FIT é realizado em formato presencial, com um público reduzido e com todas medidas de segurança necessárias adotadas, e virtual. O acesso on-line está disponível apenas para inscritos no evento.

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